1.
De repente, fiquei mais um mês sem escrever aqui. Poderia elencar várias razões para não ter publicado nada, mesmo tendo prometido fazer pelo menos um post quinzenal. Mas não mentirei: não publiquei nada, mas estive o tempo todo online. Mais do que eu gostaria que estivesse. Muito mais.
2.
Sim, este será mais um post desconexo sobre a grande desgraça que é estar na internet em 2023. Breves notas que irão misturar experiência pessoal com contexto coletivo, que é a única forma que aprendi a escrever sobre o tema.
3.
No fundo, eu admiro as pessoas que continuam a afirmar com convicção que seguem se divertindo na internet de 2023, que até dizem e repetem com orgulho que são parte de uma geração que está constantemente online. Também sou parte dessa geração, mas tenho vergonha de afirmar isso. Afinal, a permanência na internet apresenta-se a mim mais como um aspecto negativo do que positivo.
4.
Mas por que não consigo largar a internet? Ou pelo menos diminuo de maneira drástica o tempo passado nela? Uma hipótese: pois sou persistente. Tenho uma capacidade imensa de ficar procurando no meio de tanto lixo alguma pepita de ouro que possa me dar prazer, nem que sejam por poucos minutos. Além disso, prefiro muito mais iniciar uma busca por alguma coisa do que terminar uma busca. Nessas situações, acredito bastante que o trajeto é mais importante que o prêmio final.
5
Mas, pensando na internet, como seguir acreditando que o trajeto é o mais importante, se as únicas coisas boas que a internet legou a nós nos últimos anos estão acabando da maneira mais previsível - ou seja, sendo comprada por bilionários que são especialistas somente em engordar as suas já obesas contas bancárias e demitindo gente que realmente trabalhou para que aquele espaço fosse algo bom?
Esta semana, o Bandcamp, talvez a melhor plataforma para ouvir e buscar informações sobre música independente de todas as partes do mundo, anunciou a demissão de metade de seus funcionários, logo após ter sido vendida por uma empresa multibilionária e comprada por outra empresa multibilionária. A Pitchfork publicou um artigo resumindo a importância do Bandcamp para os ouvintes de música de hoje, além de um breve resumo do deprimente processo de compra e venda por investidores no último ano. E o Deerhoof, grande banda norte-americana de rock independente, resumiu a situação em um tweet:
6.
O jornalista Cory Doctorow inicia assim um artigo para a Wired: “É assim que as plataformas morrem: Primeiro, elas são boas para seus usuários; depois, abusam de seus usuários para melhorar as coisas para seus clientes comerciais; por fim, abusam desses clientes comerciais para recuperar todo o valor para si. Então, elas morrem.” Ele chama esse processão de “enshittification” (“merdassificação”, em uma tradução livre minha). É um comentário sobre as plataformas como Amazon, Google, Facebook, Twitter e, finalmente, TikTok. Ou seja: toda a internet de hoje.
7.
E é por isso que eu acho que um texto sobre como a internet de hoje está horrível também precisa incluir o Substack. Sim, esta plataforma em que escrevo e posto estas palavras. Por que, por mais tempo que eu ignore, os sinais da “enshittification” desta plataforma estão por toda parte. Por exemplo, nos e-mails que eu recebo com dicas sobre como fazer uma newsletter com melhor desempenho e alcance de usuários. Eu recebo esses guias bem detalhados e apurados, com vários exemplos de sucesso, e a única coisa que consigo sentir é preguiça. Sei que talvez este texto seja um suicídio para qualquer tipo de sucesso que eu almeje com este espaço que criei pra escrever o que eu quero. Mas também acredito que, para refletir sobre a internet de hoje, é preciso apontar em voz alta e com o dedo indicador levantado para o que eu não gosto e o que não aprovo.
8.
Uma frase deste artigo da The New Yorker sobre o fato da internet não estar mais divertida, e que veio a calhar com a frustração dos últimos dias: “Hoje em dia, a Internet parece mais vazia, como um corredor que ecoa, embora esteja repleta de mais conteúdo do que nunca. Ela também parece menos casualmente informativa.”
9.
Mais uma hipótese: voltarei a ficar satisfeito com a internet quando eu começar a passar menos tempo online e quando for mais espontâneo para criar algo. Para todos, vale os mesmos desejos.
Outros temas:
Começou a Mostra Internacional de Cinema aqui em São Paulo; vai até o dia 1º de novembro. Retrospectiva Michelangelo Antonioni, restaurações de filmes de Pedro Costa, Jacques Rivette, Man Ray e Manoel de Oliveira, filmes novos de Hong Sang-Soo, Christian Petzold, Victor Erice, entre outros. Pretendo ver vários filmes na edição deste ano; quem sabe não venha um diário dessas sessões, na próxima edição desta newsletter? Pra saber mais, acesse o site da Mostra.
Estou no BlueSky, a rede social que está mais tranquila que o Twitter (ou, argh, X). E, como presente, eis cinco convites para o BlueSky, a quem quiser criar uma conta lá. Quem pegar primeiro, leva!
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Por fim, uma música para acalmar a todos para este final de semana:
Um grande abraço a todos e até a próxima edição!